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terça-feira, 4 de outubro de 2011

Dicas para "sair do Armário"

O Dia de Sair do Armário, 11 de outubro, que passa a ser comemorado no Brasil a partir de 2009 por iniciativa do Estruturação - Grupo LGBT de Brasília, quer justamente suscitar essa reflexão. Até que ponto aceitar ter uma vida cheia de máscaras? Qual o limite de ficar "agradando" ou "não decepcionando" pessoas imaginando que elas nos amam de verdade sendo que, de forma real, elas só lidam com um "personagem" que interpretamos por não nos assumirmos? Vale realmente a pena sacrificar a própria felicidade em nome da alegria da mãe, do pai, da vizinha, do padeiro, do chefe, da "melhor" amiga, do ex-professor etc, etc? Você pensa na felicidade dos outros, mas quem pensa na sua?
Por tudo o que foi exposto, vejam as indicações a seguir não como normas, mas sim como considerações sobre formas de se assumir homossexual, bissexual, travestis, transexual ou transgênero. Tudo isso em nome da única regra que realmente deve ser seguida: sermos felizes como realmente desejamos e temos direito de ser.

: : Será que sou?

Está sentindo atração por alguém do mesmo sexo? Tente analisar melhor essa sensação. Leia sobre o assunto, veja alguém aberto para conversar sobre isso com você. Sente-se melhor se comportando socialmente como o sexo oposto? A indicação é a mesma. Sim, você pode ser travesti, transexual ou transgênero. Ou não. Em ambos casos, não antecipe questões. Antes de você se ver frente à dúvida sobre o que vai fazer se você for LGBT, é necessário responder para si mesmo/a se você é ou não homossexual, bissexual, travesti, transexual ou transgênero.
Independente de quando você comece a sentir essa atração, permita-se conhecer o que sente, como seu corpo, sua mente reagem. E aí, uma verdade: pode ser algo passageiro ou não. De novo, por mais difícil que seja, viva as coisas passo a passo. E o primeiro deles tem de ser o diálogo mais fundamental de todos: você com você mesmo/a. E se puder contar com o apoio de alguém que lhe dê confiança, nossa, melhor ainda. Há grupos de ativismo arco-íris também, eles podem te ajudar. Informe-se sobre os da sua cidade.
Ah, sim, na adolescência, as questões que envolvem identidade, desejo e amor são ainda mais inquietantes. E saiba que isso é normal. É a fase mesmo para descobertas tanto do mundo quanto de si mesmo/a. E o "privilégio" de ter de lidar com tantas perguntas não é só seu. Não mesmo. Seja hétero, LGBT ou "em dúvida", cada um/a passa pela necessidade de se achar no mundo. Encare esse período de forma natural.

: : Acho que sou. E agora?

Quer seja você hétero, homo, bissexual ou travesti, transexual ou transgênero tenha consciência plena que você não é uma aberração, alguém doente, errado, que deva ser "consertado/a" ou 'curada/o". Ser LGBT é tão normal quanto ser heterossexual. Sua sensação pode ser colocada como a de um negro em meio a uma sociedade que coloca como bom ou certo apenas o que é de outras etnias. Não é você que está errado/a por ser como você é, os outros é que devem deixar de ver a diversidade como algo errado. O mesmo vale para as mulheres em um ambiente que valoriza apenas o masculino. Quem está errado são os homofóbicos, os racistas e os machistas, não nós. Vai ser normal surgir o desejo de se ser como "os outros", ser igual.
Agora o ponto: no mundo há tantas etnias, tantas culturas, tantas formas de ver o mundo, tantos jeitos de encarar a vida, tantas religiões.. E há gente baixa, alta, gorda, magra, punk, mano, patricinha, "paz e amor"... A lição está aí, basta a assimilarmos: o ser humano é diverso. E quem tentou ou tenta deixar as coisas iguais só merece sentir vergonha por lutar contra algo que nos faz essencialmente humanos. Ser LGBT é apenas mais uma característica de cada um/a.
Continuaremos a ser pessoas com sonhos, com defeitos, com momentos de tristeza e de alegria, com peculiaridades e tudo mais. O segredo é você ter firme dentro de si mesmo/a: "Seja qual for a resposta que eu encontre sobre minha sexualidade e minha identidade, não é ser como a maioria ou não que me fará ser mais errado/a ou menos certo/a do que os outros. Sou eu e ponto. Se diferente ou igual tanto faz. Nos dois casos, mereço ser feliz e respeitado/a pelo o que sou".


: : Qual o momento certo para sair do armário?

Nem comece a pensar que o momento "certo" de se assumir tem a ver com a idade. O tempo que deve ser levando em conta é quando você se sentir bem, primeiramente, com você mesma/o. Esse é o "relógio" que deve ser consultado. Imagine ir para uma prova sem ter estudado, você terá condições mínimas para dar conta do recado! Isso vale para a saída do armário.
A primeira coisa que deve estar em sintonia, estar bem é sua cabeça, seus pensamentos. Mas não precisa esperar esse ponto para pedir ajuda a alguém caso precise. Tente ver um/a grande amigo/a (mas de verdade mesmo), um/a professor/a, um parente com o qual você tenha um diálogo bom, um grupo de ativismo arco-íris, um psicólogo... Vai ser ótimo para você ter alguém para conversar, desabafar. Com você fortalecida/o, aí você pode dar o próximo passo: contar para mais alguém, e daí, o outro passo. O caminho acaba se formando.
Claro, claro, ninguém aqui está vendendo a idéia de que será fácil. Nem usamos essa palavra aqui até agora. A razão disso é porque a reação das pessoas pode ser imprevisível. A campanha Dia de Sair do Armário 2009 colheu depoimentos de LGBTs conhecidos sobre o outing deles (leia aqui).
Há gente que ganhou do pai viagem com o namorado, há pessoas que não tiveram a vida em nada mudada e outros que passaram por momentos horríveis. Agora, veja bem a resposta dessas pessoas para a pergunta sobre se é melhor viver dentro ou fora do armário! E fácil.. O que é fácil na vida? Passar no vestibular? Enfrentar o mercado de trabalho? Começar ou terminar uma relação? Fazer o salário durar até o final do mês? É, se fóssemos escolher apenas o que é fácil, é bem certo que não viveríamos.


: : Meus pais... Eles vão me matar! Ou me odiar!
Ou me deserdar! Ou tudo isso junto!

Muitas pessoas dão grande valor à família. E se ver como alguém que vai "destruir" os sonhos que pais, sem nos perguntar nada, tiveram para nós ou que vai ser em carne e osso algo que é contra a religião deles, por exemplo, não é a melhor das sensações. Pode ser devastador.
Voltemos ao ponto que tanto já falamos: o principal de tudo é você se sentir bem com você mesmo. Seja você hétero, gay, lésbica, bi, travesti, transexual ou transgênero. Se você já conseguir ver que sua orientação sexual ou sua identidade de gênero, independente de qual seja ela, só é uma das várias possiblidades de se ser, sem isso significar uma doença ou erro, aí já se terá grande parte do que você precisa para ser feliz. O restante é conseqüência.
Quanto aos pais, familiares ou outras pessoas as quais você quer bem... Que tal ir os testando? Veja a reação deles quando vêem LGBT na TV, por exemplo. Se falarem mal, já comece a educá-los: "Ah, pai, deixa o povo em paz. Cada um é cada um". Viu? Você deu seu recado e não se comprometeu! Ou: "Ah, eu tenho uma amiga lésbica e ela é mó gente boa". Mais um ponto para você. Dessa forma, quem fez o comentário negativo, vai ter de engolir que o discurso contra LGBTs já não é tão aceito assim. Que vivemos em uma época em que respeitar a diversidade tem cada dia mais adeptos e defensores. Se deixarmos os comentários homofóbicos sem resposta, eles vão ganhando força e mais força. E o dia em que você for se assumir... Aí, você poderá colher o que de ruim aquelas idéias possuem.
Longe de isso ser uma receita infalível. É só uma dica para que quem não aceita LGBTs vá descontruindo o preconceito aos poucos. Porque é isso: um "pré-conceito" é uma avaliação que se tem de algo sem realmente conhecer sobre o que se fala. Para contrapor isso, é educação, é mostrar as coisas. Quando as pessoas vêem que somos como elas, que pegamos ônibus, que temos duas pernas, dois braços e adoramos dormir até tarde e lamber embalagem de chocolate derretido, como todo mundo, bom, aí estará vencida a primeira fase para que a homofobia se desfaça.


: : Iupiiii, vou me assumir agora. Assim que terminar de ler esse texto!

Ei, calma lá com o andor porque, no caso, a drag queen tá sem adesivo na peruca e figurino pode despencar. Também não precisa ser assim! Quer dizer, pode ser assim, mas, antes de sair do armário, pense no que de bom pode acontecer, claro, mas também veja se você dará conta do que de ruim pode vir. Sua família pode te expulsar de casa, você pode ser despedido/a do trabalho... Antes de mais nada, saiba de seus direitos para enfrentar isso. Os pais têm a obrigação legal de sustentar o/a filho/a até que ela/e termine os estudos por exemplo.
A maioria da população brasileira vive em unidades da Federação que colocam explicitamente em leis a proibição de atos discriminatórios contra LGBT. Um shopping inteiro pode até ser fechado por conta disso, sabia? Fe-cha-do. No mais, a Constituição é clara: nenhum tipo de discriminação pode ser aceita. Foi demitida/o por ser LGBT? Cabe um processo na Justiça do Trabalho contra isso. E sabe seu salário? Pois é, a indenização pode ser ele multiplicado por alguns bons números. Uma escola permitiu que uma aluna LGBT fosse discriminada? A responsabilidade de evitar que isso aconteça é da direção. Ela deve ser responsabilizada. Uma vendedora fez chacota por você ser LGBT? Lei do Consumidor e Código Penal nela para começar! A questão é essa: quem tem poder hoje em dia não é quem tem força física ou sabe gritar alto. É quem tem informação.
No mais, não precisa também pensar que sua vida será em um cartório processando pessoas e empresas. Cada vez mais a questão da diversidade de orientação sexual e identidade de gênero é debatida no país, defendida por governos e colocada na mídia de forma positiva. Estamos ensinando o Brasil a nos respeitar.
E se nós temos poder? Vamos ficar em apenas dois exemplos: sabe quem faz o maior ato cívico na história no Brasil do descobrimento, em 1500, até hoje? Nós LGBT e milhões de simpatizantes na Parada do Orgulho LGBT de São Paulo, a maior do mundo. E você saberia dizer quais são as maiores manifestações de direitos humanos da história recente do país? As paradas do orgulho esplalhadas por todos os cantos da nação. E aí, temos força ou não?

Se a saída do armário vai ser agora, amanhã ao meio-dia, ano que vem... Enfim, isso não é o mais urgente. A questão principal é vermos a cada dia se estamos deixando de ser completas/os, se estamos tornando nossa vida uma mentira em nome do que os outros querem e não do que nossa felicidade precisa para acontecer. O processo pode ser lento ou rápido, o que não pode ocorrer é ele não existir. Porque a dor de olhar para trás em nossas vidas e vermos que só vivemos em função dos outros e nunca em nome do que sonhávamos... Isso sim é deve ser difícil enfrentar. E tempo é algo que não se recupera.

Sejamos, todos e todas nós, felizes! Boa saída de armário para todas/os. Boa entrada em uma vida mais plena também!


Esse texto faz parte da campanha Dia de Sair do Armário 2009.
Conheça as várias ações realizadas aqui

Fotos: Antenna, Photodisc, Stockbyte, Ryan McVay e Image Source

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