SOMOS TODOS CULPADOS
Por Marinalva Santana*
Há cerca de 03 anos, um sábio e sério servidor do Tribunal de Justiça do Piauí, em tom de desabafo, cunhou uma frase lapidar: “aqui, o certo é fazer errado”.
Embora não pareça, o desabafo desse servidor é uma paráfrase da declaração feita pelo Corregedor do Conselho Nacional de Justiça – CNJ, ministro Francisco Falcão, dando conta que a "situação do [Judiciário] do Piauí é a mais grave do País.”
Econômico em suas palavras, o Ministro Francisco Falcão se limitou a elencar somente algumas situações para ilustrar sua assertiva. Apesar de contundente, a frase do Corregedor não constitui novidade alguma, além de não dar a dimensão real da vexatória situação do Poder Judiciário Piauiense. Nas 37 páginas do relatório de inspeção do CNJ, são listadas várias outras situações “gravíssimas”. Algumas delas, aliás, já requentadas, posto que detectadas em inspeções outrora realizadas pelo Conselho.
Como é cediço, nenhuma dessas irregularidades são obra do além. Os responsáveis são ilustres conhecidos. Entretanto, a impunidade alimenta a capacidade ímpar dos protagonistas dessa história kafkiana em (re)inventar mecanismos para burlar os mais comezinhos princípios da Administração Pública.
É certo que nesse enredo alguns são, disparadamente, mais culpados que outros. Todavia, numa análise mais acurada, podem ser encontradas as digitais de autoria de todos nós. Em apertada síntese: somos todos culpados! Admitir isso é o primeiro passo para reverter a “situação gravíssima” atual. Do contrário, pactos pela justiça constituem mera figura de retórica ou jogo de nonsense...
A limitação de espaço impede tergiversações sobre as responsabilidades de nós servidores, magistrados e outros operadores do Direito que atuam diretamente no funcionamento (?) da máquina judiciária.
Emblemática, porém, é a omissão da sociedade, beirando às vezes à cumplicidade. Como se sabe, a conta alta para manter a máquina Judiciária é paga por todos os piauienses. Assim, a mácula de “pior Judiciário do Brasil” atinge fortemente a todas as pessoas, inclusive as mais pobres. Então por que, mesmo diante de situação tão grave, não há sequer um esboço de reação por parte da dita sociedade civil organizada?
Por que ainda se paga sem reclamar a fatura da arcaica e ilegal prática do nepotismo (realimentado na sua forma cruzada)? Por que os explorados trabalhadores piauienses ainda se sujeitam a arcar com os altíssimos custos das mordomias palacianas? Por que os salários dos maus magistrados, pegos com a “boca na botija”, ainda são pagos com o suor de nosso rosto – e ninguém diz nada?
Várias outras perguntas poderiam ser feitas, para esgotar o rosário de vícios e irregularidades. Diversas também são as respostas possíveis para explicar essas anomalias. Entretanto, enquanto perdurar o silêncio e a omissão da sociedade piauiense diante da “situação gravíssima” verbalizada pelo Corregedor do CNJ, a frase lapidar do sábio e sério servidor do Tribunal de Justiça continuará válida e atual.
*Marinalva Santana é servidora concursada do Tribunal de Justiça do Piauí